Foi com alegria que este ano assisti a um Web Summit onde o ambiente esteve no centro das atenções. Não que a tecnologia fosse para segundo plano. Pelo contrário. A edição deste ano, totalmente realizada online, deu a conhecer em muitas das conferências o quanto a evolução tecnológica pode trabalhar a favor do planeta e, por consequência, da humanidade.
Dos três dias de Web Summit, duas sessões cativaram-me e falaram especialmente ao coração e a causas que tenho defendido. A primeira sobre um futuro livre de plástico e a segunda com uma das mulheres mais emblemáticas do nosso tempo, no que diz respeito à defesa da natureza e dos animais: Jane Goodhall.
Bali e um mundo sem plástico em debate no Web Summit
“Grabbing a plastic-free future by the bottle” [“Agarrando um futuro sem plástico pela garrafa”] é o nome da conferência que juntou Dianna Cohen, fundadora e CEO da Plastic Pollution Coalition, o cantor e compositor Jackson Browne e a jovem Melati Wijsen, jovem ativista balinesa e impulsionadora do projeto Bye Bye Plastic Bags.
Em maio do ano passado fui convidada a dar uma palestra sobre poluição e os efeitos do turismo. Acabada de chegar de Bali, na Indonésia, levei ao palco daquela universidade em Lisboa o que tinha visto em termos de poluição naquele que é considerado como um dos locais mais poluídos do mundo e o quanto já estavam a ser implementadas medidas para lutar contra uso do plástico.
Melati Wijsen e a sua irmã estiveram por detrás dessa mesma revolução quando, há sete anos atrás, lançaram o Bye Bye Plastic Bags e começaram a trabalhar no sentido de banir o uso de sacos de plástico na sua ilha-natal, conduzindo a uma autêntica revolução ambiental e cultural. Um trabalho que abrange hoje outras áreas e já se estende além fronteiras, juntando jovens de todo o mundo.
No Web Summit deste ano, Melati foi convidada para falar sobre isso mesmo e de que modo uma ideia pode ser catalisadora de mudanças profundas.
“A ideia [de livrar Bali da poluição de plástico] começou com a minha irmã, quando estávamos em casa” contou a jovem balinesa. “Não sabíamos como íamos lá chegar, não tínhamos nenhum business plan ou estratégia. Apenas um objetivo que sabíamos que outros 40 países à volta do mundo já tinham implementado. Por isso, pensámos: Vamos lá Bali! Vamos lá Indonésia! Nós também conseguimos!”

Assim começou a viagem de Melati, conseguindo mobilizar uma série de pessoas ao ponto de agora Bali ser uma ilha livre de plástico.
“Isto mostra que, não importa o quanto esmagadora a poluição de plástico possa ser, temos que começar esta conversa e levar à mudança de políticas. Estamos a falar sobre implementar soluções que são acessíveis às massas para que todos possamos participar nesta mudança e ninguém fique para trás,” sublinha a oradora.
Os ensinamentos de Jane Goodhall
A conversa de Melati foi deveras inspiradora, mas a conferência que tinha mais curiosidade de ver neste Web Summit era a da grande Jane Goodhall. A primatóloga que dedicou 40 anos da sua vida a estudar os chimpanzés na Tanzânia, em África (experiência que gerou livros e filmes conhecidos por todos), chegou a esta edição na companhia de Pieter Van Midwoud, do Ecosia, o motor de busca que planta árvores.
Ambos (Jane através do seu The Jane Goodall Institute) têm em conjunto um projeto de implementação de corredores de árvores no Uganda.

Quem é Jane Goodhall nas palavras de Jane Goodhall
“O meu sonho de ir para África não começou com a intenção de me tornar numa cientista, nem para estudar nenhum animal em particular. Eu cresci durante a guerra, não havia televisão. Eu lia livros e inspirava-me com o Dr. Doolittle e o Tarzan. Tinha 10 anos quando nasceu o meu sonho de ir a África, viver lá e escrever livros sobre animais.
Sempre tive o maior apoio da minha mãe, que sempre me disse que se quisesse muito uma coisa, teria que trabalhar muito para a conseguir, aproveitar todas as oportunidades e que se não desistisse conseguiria achar um caminho. Esta é uma mensagem que tenho levado a jovens por todo o mundo.
Consegui chegar a África e conheci o famoso paleontólogo Louis Leakey e foi ele quem sugeriu que eu fosse estudar os chimpanzés.
Eu não tinha feito faculdade e ele, um ano mais tarde, disse-me que eu tinha que ir tirar um Ph.D. Eu tirei o curso e foram os dias mais felizes da minha vida. Estive na floresta tropical a construir uma estação de pesquisa e investigação.
Depois saí porque cheguei à conclusão de que as coisas estavam a piorar e se eu podia fazer alguma coisa para ajudar, eu tinha que tentar.
Tenho quase 87 anos e sei que vou passar o resto da minha vida a lutar pela justiça social, pela inclusão do bem-estar animal, pelos direitos dos mais novos e por lhes dar poder para fazerem do mundo um sítio melhor.”
Aos 87 anos, a Jane que apareceu nos ecrãs dos computadores continua com ar jovial e um olhar cativante que conquista a atenção. O trabalho que faz com o seu instituto; a sua opinião sobre o facto do aparecimento do Covid-19 estar relacionado com o crescente desrespeito pelo meio natural e animal; ou o papel que todos temos no futuro do ambiente, foram apenas alguns dos temas abordados.
“Acho que a educação é a chave e precisamos de entender o que estamos a fazer ao planeta e, ao mesmo tempo, precisamos de ser inspirados e entender como nós, como indivíduos, podemos lutar contra o que muitos consideram ser inevitável,” refere a mensageira pela paz das Nações Unidas, acrescentando: “Se continuarmos com o business as usual, então, como uma espécie, estamos condenados. Em alguns locais já estamos a usar os preciosos recursos naturais mais rapidamente do que a Natureza consegue repor.”
Para Goodhall, “o Covid-19 foi para muitas pessoas um wake-up call. À medida que emergimos da pandemia, não temos mais nenhuma alternativa do que confrontar uma ameaça ainda maior ao nosso futuro, que são as alterações climatéricas. E está nas nossas mãos fazer tudo o que pudermos, todos os dias, para lutar contra isso.”

Terminei este Web Summit de alma cheia, por perceber que tantas pessoas têm dedicado o seu tempo, as suas vidas, para desenvolver projetos que lidam com os problemas emergentes das alterações climáticas e da poluição.
Pode agora estar a pensar: “mas que raio tem isto tudo a ver com viagens?”… a verdade é que viajamos para conhecer o mundo e as pessoas que o preenchem e sempre achei (e acho) que temos o papel, como viajantes, de dar a conhecer aquilo que de melhor se faz no planeta, bem como a melhor forma de o preservar.
Por isso, hoje trago-vos estas duas mulheres inspiradoras. Duas gerações tão diferentes mas que dedicam as suas vidas para o bem maior, que é delas, meu e de todos nós.

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